quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Armário





Estava aqui com meus botões emperrados, pensando se existe um jeitinho bom, uma fórmula, de como decidir pelo melhor, pelo que vai te dar algum sucesso nessa vida.
Falam de pensar positivo, de fé, de aqui se faz aqui se paga, tem até um livro aí que fala do segredo, mas pra mim isso tudo é muito abstrato...
E abstração, infelizmente, nunca foi eficiente no meu mundo.
Essa paranóia toda rolou, quando enfiei meu pé fundo na areia fofa daquela praia.
Foi quase como uma constatação, resultado de anos de pesquisa torta.
Era a isso que me referia.
Vida real, cotidiano, possibilidade, coisa que acontece, que dá pra tatear.
Era meu pé que estava ali enfiado naquela areia branca.
E aquele conjunto era bom. Me dava prazer.
Eu vi que não queria nenhum outro lugar nesse mundão de praias paradisíacas, paisagens coloridas e luxos surreais, que não fosse aquele chão onde meu pé estava plantado.
Nenhum camarote em Ibiza com caras sarados.
Nenhuma fazendinha silenciosa com vacas pastando.
Era só ali, o meu lugar.
Na minha mão direita tinha um copo plástico mastigado, com cerveja dentro.
Ele suava, brotava um monte de gotinhas que corriam loucas pela superfície e saíam do copo pra pousar justo na minha perna quente do sol.
E era um arrepio gostoso, que trazia aquela mesma sensação, que eu experimentei com os pés na areia.
Sensação viva de estar no centro do meu desejo. Era eu inteirinha ali naquela tarde de verão.
Foi aí que eu lembrei  das vezes em que amarguei vontades reprimidas, que tatuei rosto feliz na cara, que botei salto alto com dor, roupa apertada e quente, discursei texto falso e interpretei no estilo novela mexicana. Lembrei  do dia  que coçou o pé quando tocou minha música e eu não dancei, das chances que perdi, em nome do que é socialmente bonito, de ser feliz.
Defini então a minha fórmula.
Naquela tarde eu entendi que bom mesmo é me limitar pela sensatez do medo que freia, me impulsionar pelo desejo que atiça e ir adiante com a coragem que abre precedente. Respeitar meu paladar, minha história e o apelo doce de quem eu amo. Deus, nessa história toda e por motivos logicamente hierárquicos, é quem determina a porção e a hora exata que cada um desses ingredientes entra na mistura.
Eu descobri, por fim, que o certo é sempre clichê.
Se quer beijar, beije. Amar, ame. Viajar pro Iraque, comer quindim tendo colesterol, chorar na frente da sua mulher, mudar de curso no último ano de formação, virar hippie, sentir medo.
Enfim, se assuma. Eu só fui feliz realmente, quando saí do armário.



Um comentário:

  1. Muito bom! Me identifico muito com a sinceridade dos sentimentos que vc escreve. Continue! Beijo!

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