quarta-feira, 27 de março de 2013

Preguiça de gente.



Acho que é da gente mesmo, querer facilitar o jeito de viver, de achar que se entende, pra fingir que sabe se relacionar. Facilitar o pensamento. Encurtar conversas. Encolher neurônios. 
A gente tem uma natureza vadia de tapar o sol com a peneira, uma preguiça de buscar a verdade e de lidar com a essência bruta do outro.
A gente se reboca, passa um photoshop e let it be.
A parte de dentro é muito longe pra se chegar e já que estamos sempre atrasados, vamos ficar aqui na tona. À margem da vida.

Seja usando abreviações inimagináveis nas conversas virtuais, seja amontoando uma hashtag atrás da outra numa foto bonita, seja trocando “eu te amo” como quem troca um bom dia com o estranho que passa na rua, seja baixando mil aplicativos que nos aproximem da frieza dos teclados alheios.
Seja no internet banking. Seja no drive thru.
É lindo. É rápido. É moderno e convence nos primeiros 15 minutos. E pra quê precisamos de mais tempo, se as coisas têm durado, só 15 minutos mesmo?

Bem vindo a era Cult. A era Fast.

Agora a gente dá nome e endereço eletrônico pras dores. Baixa, de graça, a história que o outro gasta tempo e dinheiro pra escrever. A pessoa compõe, perde madrugadas produzindo, mas a gente prefere comprar qualquer pirataria  barata que as más línguas vendem aí na rua. Julga a puta e o santinho, batendo o martelo sobre a moral alheia na rodinha de amigos, pagando de Deus.
A gente anda é esquecendo que as verdades mais essenciais de cada um, não se encontram, por aí, compartilhadas. Só nós, somos autorizados a reproduzir a cópia fiel das nossas obras.
A gente anda é com preguiça de se interessar pelo que há dentro do coração. Pra que perder tempo em se aprofundar, se é tudo raso?
A verdade é que a gente é música, é fase, é dia-a-dia e choro guardado seguido de riso escancarado, e isso, os perfis não contam.

A gente, pra simplificar o rito,  personifica os sentidos alheios. Se riem, se choram, se casam ou separam, é culpa de alguém e nunca de algo.

Conclui apressadamente, que são sempre "pessoas" as causadoras dos delírios, sem se atentar muitas vezes, que o coração também se entrega às coisas,  aos momentos. 
Sem querer entender que as vezes são pássaros, noutras algumas tardes no mar. 
Que alegrias podem vir de fatos sem endereço, sem lenço, nem documento. E aí, quem esteve junto, na alegria ou na tristeza, vai ser lembrado pelo pacote, por ter a sorte de compor aquele retrato.


A gente usa números e estatísticas. Enumera beijos, amores, conta derrotas e tombos, sem saber que estes, são uma coisa só.

Sem saber que a vida é já e é só essa.

Que a vida é esse fio forte que liga um fato ao outro, que começa quando a gente nasce e termina, só quando se morre.
Que é uma mania muito indecente essa de querer fatiar esse intervalo. 
Contabilizar, dividir as coisas, pessoas e corações.

A gente cria regras e postulados sem lembrar, portanto, dos amores de verão que já subiram a serra e os príncipes loucos que contrariaram a história pra virarem sapos.

Eu tô com meu saco cheio de lidar com pequenices. Gente que aponta os outros pra se autoafirmar, que concorda só pra levar pra cama, que julga só por ser babaca mesmo.

Acho que é da gente mesmo, esse jeito tosco de viver. De perder em harmonia pra qualquer família de chimpanzés. É da gente, a façanha de inverter o mandamento e amar mais a gente do que o próximo. 

É da gente mesmo, não saber ser gente.



segunda-feira, 18 de março de 2013

Sobre Vênus e Marte





Eu queria tentar falar algo inteligente sobre a paixão das mulheres.

Essa coisa meio física, meio ilógica, essa natureza intensa de se doer ou se doar por quem nada tem nem a ver com a gente, nem com nossos delírios mais pessoais e muitas vezes, nada pra dar em troca.
Já procurei entender essa mania cansativa que é gostar de alguém e quase desisti porque a gente percebe que cada tentativa de compreensão é frustrada pelas milhões de maneiras da gente se descobrir apaixonada.

Objetos de desejo, são em regra, tão opostos, quanto samba e rock.

As vezes eu penso que é o beijo que manda a mensagem pro coração apaixonar, noutras o sapato, a roupa, outras ainda, o jeito de sorrir.
Mas em outros momentos eu percebo tanta confusão causada pelo safado do coração que fico sem resposta, afinal a gente vive se traindo quando se imagina no altar com o moço que usa sapatênis, quando sonha dois filhos com o menino que não sabe beijar e planeja envelhecer ao lado do carinha que não conhece sua banda favorita.

Uma amiga disse uma vez que quando o coração gosta, não importa se a outra pessoa escreve usando x e repetindo vogal. E , de fato, essa é uma verdade importante sobre a paixão.

As vezes, o abismo que separa os apaixonados é tão grande, que pode parecer sem sentido compartilhar aquela música favorita, porque afinal, o outro nem faz ideia de onde vem o som que você curte.
Não dá pra falar da sua religião, nem do seu livro de cabeceira. 

São seres deliciosamente opostos.

Mas a apaixonada dá um jeito de pegar um atalho no meio dessa distância e se vira pra encurtar o caminho.
Grava numa pen drive as suas músicas e entrega sutilmente pro moço, mas até balança a cabeça com o house que toca no carro dele.
Passa na vitrine da loja e já se supõe comprando um tênis bonito pra jogar fora o sapatênis (eu cismo com sapatênis) irritantemente “lindo” que ele usa. 
A mulher apaixonada não se entende, martela a cabeça perguntando o porquê de ser aquela pessoa tão diferente, tão sem sintonia. Por que alguém de Marte?

Porque você é de Vênus.

A mitologia diz que o deus Marte tem o amor da deusa Vênus e dessa relação nasce o filho Cupido...e o resto, a história conta. O que não se conta (e eu decidi inventar) é que o filho desse casalzinho aí,  foi ficando míope ao longo das eras e saiu flechando os corpos mais aleatoriamente estranhos nesse mundão.
Porque não é possível que a gente tenha esse gosto tão duvidoso quando se apaixona.

Taí, acho que é isso mesmo.  
A grande verdade sobre a paixão é quase um diagnóstico médico.

O cupido é vesgo.